domingo, 6 de abril de 2014

O Tempo dos Dias nas Águas dos Deuses

Dasmile, uma jovem clériga de Tanna-Toh.

           Já conhece o calendário de Arton? Caso não, você gostaria de aprender um pouco sobre ele? Na história a seguir, você poderá fazê-lo de uma forma divertida. Já o conhece? Então melhor ainda. Neste caso, você poderá aproveitar este pequeno conto sem se preocupar com mais nada. Trata-se de uma experiência que fiz com meus jogadores; uma forma eficiente, prática e divertida de aprofundar a história de seus personagens e também da campanha em si, sem gastar tempo das sessões para isto.

           Mas falarei sobre isso mais a frente. Antes, gostaria de convidá-los mais uma vez a acompanhar este breve momento de descanso na aventuresca vida de uma clériga de Tanna-Toh, e de seu companheiro anão caçador de nome bastante... pitoresco (pra não dizer "zoado", haha).

           Vamos lá?

O símbolo da Ordem



O Tempo dos Dias nas Águas dos Deuses

           30 sob Pace, 1396 do calendário élfico.

           – Tempo não é um bem infinito. O tempo escoa, corre, desaparece. Desde o dia em que nascemos nosso tempo não cessa a nos escapar. Tudo que desejamos fazer neste mundo tem que ser feito neste tempo. E por isso é tão importante contar o tempo – dizia Dasmile, sob os olhares e ouvidos atentos da tripulação.
 
          Quando a jovem clériga de Tanna-Toh pôs-se a conversar com aqueles jovens marinheiros de olhos repuxados, responsáveis por manter o junco tamuraniano em movimento e singrando as águas do Rio dos Deuses em direção à nascente, descobrira entre eles tantos que nem mesmo muitas histórias conheciam, tanto menos ainda outros que sabiam ler. A verdadeira missão de um clérigo da deusa do conhecimento é apenas uma: educar os povos. E Dasmile mostrava o quão séria era sua ordem no cumprimento do dever. João Hunter, seu inseparável amigo, assistia com grande interesse ao discurso que já ouvira umas cem vezes, como costumava exagerar, mas não cansava de presenciar novamente.

           A empolgação da juventude! – Pensava.

           E da mesma forma que o incansável anão, Dasmile não parecia jamais sofrer de fadiga por repetir as palavras que aprendera na Grande Escola de Tanna-Toh. Não, na verdade, cada vez que as repetia o fazia com mais e mais prazer.

           Os primeiros a contar o valioso tempo foram os elfos, os filhos de Glórienn, contando os ciclos lunares e solares. Depois os anões. Mas os anões vivem em baixo da terra e não veem a lua ou o sol, não? Se duvidarem, meu companheiro João que ali está pode lhes atestar. – Disse, apontando para o caçador que se escorava na lateral do navio, muito confortável com seu longo cachimbo. Nada melhor que uma elfa como ela contar uma história sobre elfos e que um anão para contar o que há para ser contado sobre anões.

           Isto mesmo, minha jovem, contamos o tempo pelos ciclos de crescimento e decomposição dos fungos – falou alto e em bom tom, com a voz grossa de todo anão que se preza e orgulhoso de seu conhecimento da cultura da raça anã e da natureza.

           Os tamuranianos pareciam realmente cada vez mais interessados naqueles relatos.

           Exatamente! – Retomou a palavra a jovem clériga. – Mas hoje contamos o tempo não conforme os elfos de Glórienn, ou os anões de Khalmyr e Tenebra, mas como os humanos de Valkaria.

           Em geral, nestas horas os ouvintes pensavam que Dasmile se referia à cidade de Valkaria, capital do reino de Deheon e também do reinado. Mas naquele dia ela falava para um povo que havia justamente se refugiado sob a sombra da gigantesca estátua ao redor da qual aquela cidade fora erigida.  Um povo que por isso conhecia o nome da deusa criadora dos humanos. Não que soubessem muito mais que isso, como o fato da deusa estar presa naquela estátua, mas já era algo digno de nota visto que Arton a fora pouquíssima gente sabia que raio de deusa era aquela. Continuou dizendo:

           Quatro são as estações e trezentos e sessenta e cinco os dias do ano, mas destes só trezentos e sessenta pertencem aos doze meses. Cinco são os dias que não pertencem a mês algum, dias singulares! – Falava a jovem elfa, em tom altivo que só os estudiosos têm.

           João a admirava, enquanto a tripulação absorvia cada uma de suas palavras.

           O Dia do Reencontro, o primeiro dia do ano e um dia de festas. O corpo de Azgher, o deus sol, brilha no céu pelo maior número de horas no ano. Então começa o verão, com os meses de trinta e um dias: Altossol, Wynn e Cyd, meses de Azgher, Wynna e Keenn respectivamente. Deuses calorosos como o clima da estação.

           Enquanto Dasmile falava, João ajeitava seu cachimbo. Notou que mais pessoas se aproximavam, atraídas pela gesticulação de sua amiga, que continuava a plenos pulmões.

           O Dia do Duelo separa o mês de Keenn do próximo, o mês de Khalmyr, seu maior rival. Como no eterno empate entre os dois deuses, o dia e a noite estão em perfeito equilíbrio, com doze horas cada um.  Então começa o outono, com os meses de vinte e nove dias: Salizz, Terraviva e Dantal, meses de Khalmyr, Allihanna e Hyninn.

O tempo escoa e o junco tamuraniano desliza pelo Rio dos Deuses.

           Dasmile fez uma pausa para respirar antes de contar sobre as colheitas feitas no mês de Allihanna, a deusa da natureza. Notou que aos marujos juntavam-se também soldados, samurais e sacerdotes de Lin-Wu, o deus da honra, todos atentos à sua história. Constrangeu-se, tímida pela juventude, mas prosseguiu.

           – E então... –  fez uma pausa dramática, – vem o dia da noite mais longa do ano, quando Tenebra, elevou a voz, – a deusa das trevas, comemora sua vitória temporária sobre Azgher. Este dia é chamado de “Noite Longa”, e a ele segue-se o inverno, com seus meses de vinte e nove dias: Luvitas, Weez e Exinn, meses de Tenebra, Tanna-Toh e Leen

           Nova pausa, desta vez para evocar o tom solene de sua próxima frase. Tomou fôlego.

           – E é então, no escasso mês de Weez, que agradecemos à grandiosa deusa do conhecimento, que nos deu a ferramenta para sobreviver ao inverno, esta época tão dura: a civilização!

           Dasmile tocou o símbolo em seu peito, emocionada. Um nó formou-se em sua garganta e a fez aguardar um momento antes de prosseguir, pois notou que os sacerdotes tamuranianos também faziam uma prece para sua deusa, não para o deles, imitando-lhe os gestos. Percebia, sua emoção e sua fé conquistavam simpatia, quase devoção.

           Quando o nó desfez-se, seguiu adiante.

           – E por fim, o Dia da Alegria é chegado, com suas fogueiras e comilanças. Após ele inicia-se a primavera, com seus meses de trinta e um dias: Lunaluz, Pace e Aurea, consagrados a Lena, Marah e Thyatis. Lena traz a vida de volta aos campos e, após o fim do mês de seu irmão Leen, o deus da morte dos humanos, o deus da ressurreição Thyatis abençoa o ano que morre no último mês, para então renascer novamente.
 
           Faltava ainda falar do dia de Nimb, o deus do caos, que ironicamente era “o dia que não tinha dia”. Em anos pares dava-se após o dia de Noite Longa, e em anos ímpares após o Dia do Reencontro. Um dia de sorte e azar, talvez mais azar do que sorte, onde se acredita que sempre alguma coisa dá errado. Em especial se tem tudo para dar certo! Superstições de todos os tipos são postas em prática para se proteger, e histórias das mais estranhas são contadas como que tendo ocorrido neste dia. Mas Dasmile narrava-as com a tranquilidade, sem se abalar. Sua fé e lealdade a Tanna-Toh eram invejáveis.
  
           Finalizou contando sobre o dia do Selag, que ocorria em anos que eram múltiplos de quatro, mas não nos que eram múltiplos de cem, com exceção dos que são múltiplos de quatrocentos, e que era um dia de ajuste no calendário. Contou como o significado de seu nome perdera-se no tempo, e sobre como seria glorioso reencontrar tal conhecimento em honra a sua deusa. Mas havia ainda algo que não contara, e João apressou-se em pedir que o fizesse.


– Não é John, é João! João Hunter, caçador. O prazer é todo "seu".

           Ahum! Senhorita Leupz… – Pigarreou, buscando chamar a atenção da amiga de forma solene. – Poderia contar-nos ainda sobre os dias da semana e os deuses das estações?

           João sinalizou com a cabeça para que não encerrasse ainda sua apresentação, apontando-lhe os pelo menos quarenta pares de olhos que ali se encontravam, todos voltados para ela.

           Pois não, meu bom senhor e amigo! – Disse a garota de forma tão pomposa que João não resistiu a uma boa gargalhada.

           Mas Dasmile nem mesmo o ouviu, pois já se pusera a discursar novamente.

           Os dias da semana são sete, mas homenageiam os seis elementos místicos que formam o mundo de Arton e seu necessário equilíbrio. Seus nomes provêm do élfico antigo, a língua de meus ancestrais. São eles: Aztag, o dia do fogo e primeiro dia da semana. Lanag, o dia do ar. Jetag, o dia da água. Tirag, o dia das trevas. Morag, o dia da terra. Kalag, o dia da luz. E por fim Valag, o dia do equilíbrio entre os elementos, também chamado “dia do descanso”. Merecido descanso, eu diria.

           E desta vez foram os marujos que se puseram a rir da graça feita pela elfa, um tanto quanto sem intenção é verdade, mas que para aqueles homens que trabalhavam de Aztag a Aztag sem descanso parecera muito divertida. Não que se queixassem; havia poucos povos em toda Arton tão empenhados e disciplinados como os sobreviventes da extinta Tamura, a distante ilha destruída pela Tormenta, a tempestade de sangue ácido que uma vez que caia em um lugar jamais vai embora, e que traz com ela aberrações indescritíveis. Dasmile contou ainda rapidamente sobre os deuses menores das estações, entre sorrisos de alegria verdadeira.

           O junco seguia cortando as águas do Rio dos Deuses calmamente, embalado por um vento frio que soprava das gélidas Montanhas Uivantes, as quais já começavam a ficar para traz. Não tardavam a chegar aos limites do território de Namalkah, terra natal de Dasmile, onde os cavalos corriam pelas pradarias. Uma elfa de Namalkah, nascida em um reino humano e cujos pais haviam afortunadamente deixado Lenórienn antes de sua destruição nas mãos da Aliança Negra. Uma elfa tão jovem e que havia também tão afortunadamente sido acolhida na ordem de Tanna-Toh, adquirindo tanto conhecimento em tão pouco tempo de vida. Para um elfo, ao menos. Elfa singular e cujo nome constava agora, afortunada ou desafortunadamente, em uma profecia tamuraniana…

           Uma profecia que sabia ela, a levaria à Tormenta.



Créditos das imagens:  http://goo.gl/4JT11Thttp://goo.gl/HL32V0, http://goo.gl/BFd7ek.

A primeira imagem da matéria foi editada por mim, a pedidos, para representar a personagem. O símbolo de Tanna-Toh foi feito por mim, baseado nas cartelas da caixa O Mundo de Arton.

Calendário de Arton: http://pt.scribd.com/doc/72918882/Calendario-de-Arton

2 comentários:

  1. foda demais.
    bem que poderia ser uma série semanal.

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    1. Haha, valeu. Na verdade, quero ver se posto coisas do tipo vez em quando. (Começo de ano não postava mais nada por falta de tempo.)

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